Pesquisa realizada anualmente pelo PMI – Project Management Institute – indica que a arte da gestão de projetos em tempos de crise vem sofrendo problemas crônicos em todo o mundo, independente do cenário econômico. Há mais de dez anos o levantamento aponta para problemas com as definições de escopo, que resultam em projetos mal detalhados, impactando negativamente em todo o processo de gerenciamento.
“A última avaliação, de 2014, aponta que mais de 50% das empresas continuam tendo desvios de custos, ou seja, a construção fica mais cara do que foi orçada inicialmente. Muitas vezes, a execução começa com o projeto básico, assim como ocorre nas obras públicas”, sendo esta uma fase crítica para a definição do escopo, afirma Paulo Roberto Uchôa, diretor da AP2M Engenharia Consultiva. Em tempos de retração econômica, qualquer quantia gasta fora daquilo que estava planejado se configura em preocupação extra. E esse é apenas um dos reflexos sentidos pela gestão de projetos nos momentos de desaceleração.
“O principal desafio é entregar um projeto no prazo, com custo e qualidade adequados. Em épocas de expansão da economia há muitas obras sendo executadas –exatamente o cenário oposto da retração. Tocar vários empreendimentos, simultaneamente ou não, interfere pouco na essência do gerenciamento de projetos. A quantidade tem influência maior nos custos indiretos”, avalia Uchôa, explicando que o custo direto é decorrente daquilo que é agregado às instalações permanentes das obras e o indireto é referente à administração da empresa que vai executar as obras.
“O custo indireto é proporcionalmente maior quando se tem menos obras. Por exemplo, contratar uma construtora para executar dez prédios simultaneamente em um ano tem custo indireto menor do que se a mesma empresa tivesse que tocar as obras de apenas um edifício no mesmo período”, detalha.
O custo indireto é proporcionalmente maior quando se tem menos obras Paulo Uchôa
MENOS TEMPO
O profissional ressalta que, em fases de retração econômica, a situação se agrava. “Investidores querem que o projeto seja executado em menos tempo, para que o custo indireto não pese muito”, diz. No seu entendimento, o custo é uma consequência e não o gerador das despesas do projeto. Portanto, mesmo recebendo grande atenção, não deveria ser o foco fundamental das disciplinas de gerenciamento de projetos. “O escopo deveria preceder em importância, ao lado da qualidade e do prazo”, teoriza Uchôa, lembrando que escopo é tudo aquilo que deve ser entregue pelo projeto. “Por exemplo: não basta estar definido que em um empreendimento serão usadas esquadrias metálicas. É preciso detalhar se esses caixilhos serão de aço ou alumínio, anodizados ou pintados, entre outras especificações”.
Das quatro áreas básicas – escopo, prazo, custo e qualidade –, a mais prejudicada em tempos de economia desaquecida é o prazo, que ganha força e passa a reger as demais. “Em épocas de vacas magras todos querem fazer o mais rápido possível para gastar menos e ter um retorno mais rápido. Ao realizar trabalhos com pressa, existe chance maior de ocorrerem erros, gerando retrabalho e mais custos. Sem mencionar a perda da qualidade”, destaca o profissional.
Investidores querem que o projeto seja executado em menos tempo, para que o custo indireto não pese muito Paulo Uchôa
FALHAS NA COMUNICAÇÃO
Na gestão de projetos a comunicação é a área de conhecimento que apresenta a maior precariedade, de acordo com a pesquisa atual do PMI. Cerca de 64% das empresas entrevistadas em 2014 afirmam que enfrentam problemas com a comunicação. “Essa deficiência está atrelada à estrutura organizacional e capacitação dos profissionais que atuam na gestão de projetos”, explica Uchôa. Ele cita o exemplo corriqueiro da interferência do projeto de elétrica no de hidráulica de um empreendimento. “É necessário, em primeiro lugar, que se tome conhecimento destes problemas rapidamente. Depois, a estrutura organizacional tem que permitir um processo ágil de comunicação. Se a saída para o problema vier a gerar custo extra – que deve ser aprovado por alguém – é interessante que exista na obra algum responsável com esse poder de decisão, para que o projeto não seja interrompido. Se não houver, a resolução do problema pode demorar a ponto de produzir impactos imprevisíveis no projeto”, fala.
DIAGNÓSTICO
A situação descrita por Uchôa revela que as estruturas de gerenciamento de projetos estão inadequadas e/ou com falhas na capacitação de profissionais. Em particular, a falta de capacitação em pensamento sistêmico é extremamente danosa. Com isso, por exemplo, ao se procurar soluções para recuperar desvios de prazos sem uma avaliação de impactos inter-relacionados às decisões planejadas, criam-se distúrbios que se ramificam na qualidade e nos custos dos projetos. “Já são mais de 600 mil os profissionais com PMP – Project Management Professional – espalhados pelo mundo. Destes, mais de 15 mil estão no Brasil. No entanto, esses especialistas se dedicam mais a processos e ferramentas, e acabam não cuidando adequadamente da estrutura organizacional e da capacitação”, finaliza Uchôa.
Paulo Roberto de Oliveira Uchôa – Engenheiro civil (1971). Associado ao PMI (Project Management Institute), com Master Certificate em Project Management pela George Washington University e Business Dynamics pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology). Trabalhou por 25 anos no grupo Promon, onde implantou e dirigiu o Centro de Competência de Gerenciamento de Projetos. É diretor da AP2M Engenharia Consultiva.