Para o professor Telmo Giolito Porto, do Departamento de Engenharia e Transporte da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (POLI-USP), uma questão fundamental a ser considerada pelo gestor de projetos ferroviários é o seu caráter multidisciplinar e sistêmico.
Sistema, explica, é um dispositivo que, para seu desempenho, exige o funcionamento harmônico de suas partes. E compara: “O corpo humano é um sistema, com subsistemas respiratório, digestivo, neurológico etc”.
A ferrovia, da mesma forma, exige que vários subsistemas estejam operando simultaneamente para que o transporte se realize: trens, vias, eletrificação, sinalização. “O mais crítico é que um subsistema se vincula a outro. A rede de alimentação elétrica e a via estão geometricamente ligadas e, alterar uma, exige a alteração da outra. A sinalização “de campo” tem que ser compatível com a embarcada no trem, e estar disponível no mesmo instante”, explica.
Porto comenta que a maioria dos projetos ferroviários que sofreram atrasos no Brasil, tem na desconsideração do caráter sistêmico da ferrovia sua principal causa. “A ferrovia tem que ser pensada como um sistema, cada parte isolada não produz transporte”, afirma.
A gestão de projetos na implantação de ferrovias, de maneira geral, envolve a definição de objetivo e metas, sua concepção, elaboração do projeto básico e executivo, execução e gerenciamento da construção da estrada. Em cada uma destas fases existem aspectos a considerar e, entre os mais importantes destacam-se as questões com desapropriações e meio ambiente.
“São temas constantes que estão na mesa do gestor. O acesso às áreas de implantação da via pode estar condicionado a processos de desapropriação ou negociação com proprietários. O impacto ambiental é um tema presente desde a concepção do empreendimento, seja pelo tempo necessário para obtenção de licenças ou pela necessidade de limitar danos à natureza, cuja mitigação gera despesas e riscos ao empreendimento”, informa.
A manutenção de equipamentos é outro tema relevante, tanto na fase de construção, quando tratamos com máquinas de terraplenagem e montagem, como na de operação do empreendimento, mais complexa.
O gestor precisa prever os ciclos a realizar, definir os locais para as oficinas, treinamento de pessoal, impacto na disponibilidade. “É essencial planejar a manutenção de equipamentos de construção e, no futuro, do material rodante da ferrovia, inclusive de equipes de socorro a equipamento com falha”, comenta.
A ferrovia tem que ser pensada como um sistema, cada parte isolada não produz transporte Telmo Giolito Porto.
O professor da área de planejamento e operação de transportes da Poli explica que a implantação de empreendimentos ferroviários envolve múltiplos especialistas: engenheiros civis especializados em via-permanente, engenheiros elétricos ou eletrotécnicos com especialização em alimentação elétrica; em sinalização e para os trens. Também necessita da atuação de engenheiros mecânicos e gerentes-administradores para a operação.
A gestão de projetos em ferrovias, segundo Porto, tem dois focos basilares: o caráter sistêmico e o controle de custos. Ele comenta que a literatura recente demonstra que, no mundo, é frequente que os empreendimentos ferroviários resultem em custo maior que o planejado. Isto teria múltiplas causas, entre elas: otimismo dos empreendedores, desconhecimento de experiência anterior em projetos semelhantes, falhas na formação de custos e preços, e corrupção.
Assim, orienta, é fundamental que haja controle de despesas e custos para evitar a paralisação do empreendimento por falta de recursos. “O custo da obra parada é descomunal: benefícios e receitas adiadas, degradação do que já está concluído, despesas com remobilização, passivos ambientais etc”.
Também é essencial que o gestor responsável informe-se sobre projetos semelhantes anteriores. “Pode não ser fácil, pois o número de projetos ferroviários é limitado, em qualquer época, e pode haver resistência em divulgar informações. Contudo, conhecer as dificuldades e a produtividade de implantações anteriores é de vital importância. Não se pode acreditar que vai construir em 12 meses, o que nunca foi implantado em menos de três anos. A “explosão” de despesas fixas decorrente do prolongamento de prazos é risco grave e fato frequente em empreendimentos ferroviários”, afirma.
Para o gerenciamento de risco, o professor afirma que deve ser “construída” uma matriz de riscos detalhada, com indicação de responsabilidades do proprietário e das empresas contratadas, assim como definidos os responsáveis por cada modalidade de risco. “Deve-se, ainda, definir racionalmente as formas de mitigação, com uso de seguros ou autosseguro responsável”, orienta.
“O estabelecimento da cultura de não decidir, pelo receio dos riscos, traz aumento de dispêndios e de prazo para o empreendimento” – Telmo Giolito Porto
No entendimento do professor Telmo Porto, a gestão de projetos é o conjunto de conhecimentos e práticas que permitem cumprir requisitos de prazo, qualidade e desempenho na implantação de empreendimentos.
“Entendo que existem conhecimentos aplicáveis a todo projeto e conhecimentos específicos. Na primeira classificação, estão noções de administração e desenvolvimento de recursos humanos, legislação trabalhista, noções de direito, contabilidade, finanças, análise de investimentos, informática e psicologia. Em paralelo, os conhecimentos específicos, por exemplo, em engenharia, serão necessários em cada caso”.
A quantidade de profissionais com conhecimentos de gestão depende da dimensão do projeto e da relação entre o proprietário da obra e a construtora. Em geral, estes empreendimentos exigem equipes de execução, que pertencem à contratada e equipes do dono da ferrovia – organização pública ou privada – que acompanham os trabalhos.
“O cliente tem que contar com equipes de gestão próprias ou contratadas para acompanhamento da obra, solução de pendências, fiscalização e replanejamento empresarial, quando necessário”, explica.
A interface entre as equipes do cliente e da contratada deve ser feita por meio de relatórios (gerais e setoriais) com diferentes níveis de agregação. Eles devem ser formulados tendo em vista o fim e o nível hierárquico a que se destinam.
Porto lembra que também é necessário definir a agenda de reuniões gerais e setoriais, com redação de ata e que haja um ‘roteiro’ para ágil resolução de problemas pela instância adequada e reprogramação de atividades.
“É muito importante estabelecer um clima de mútua colaboração entre as equipes, sem leniência, mas com a clareza do objetivo comum, que é a realização do empreendimento. O estabelecimento da ‘cultura’ de ‘não decidir’, pelo receio dos riscos, traz aumento de dispêndios e de prazo para o empreendimento”, alerta.
Os gestores, em geral, se preocupam com a parte gerencial do empreendimento e contam com o apoio de equipes técnicas. Entretanto, segundo Porto, é desejável que eles tenham noções de um ou mais subsistemas que compõem a ferrovia.
O professor explica que, tanto no caso do cliente como da contratada, aplica-se a gestão de projetos com equipes formadas por coordenador do empreendimento; gestores e equipes multidisciplinares de projeto ou apoio técnico à implantação da ferrovia; gestor e equipe de planejamento e programação de obras, incluindo metodologia de levantamento de produtividades efetivas; gestores e equipes de implantação, por subsistema; gestor e equipes de manutenção de máquinas; gestor e equipes de RH, inclusive saúde e segurança do trabalhador; contabilidade e controle patrimonial de bens; gestor responsável pelo acompanhamento econômico-financeiro da implantação; e especialistas em meio ambiente e de relações com comunidades.
“A gestão de projetos ferroviários se realiza com equipes de gestores com comandos setorizados, contudo é preciso estabelecer um responsável último pelo empreendimento”, afirma.
Porto comenta que, embora o quadro de profissionais dependa da dimensão do projeto, no mínimo ele deve ser composto de quatro gestores, sendo um coordenador, um responsável pela produção, um para projeto e outro voltado para planejamento e administração. “Dependendo do tamanho do projeto em andamento, o número máximo de gestores em uma obra pode chegar à centena”, informa.
Redação AECweb / Construmarket
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Telmo Giolito Porto – É professor do Departamento de Transportes da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), Diretor Comercial e Desenvolvimento de Negócios da Empresa Tejofran de Saneamento e Serviços. Engenheiro Civil pela Poli-USP tem Especialização em Finanças CEAG – Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
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