“Está evidente no projeto da Copa do Mundo de 2014 que o Brasil não planeja e nem gerencia adequadamente seus projetos”, afirma Cássio Germano, diretor da Portfolio Gestão e Capacitação e professor do curso de pós-graduação em Gestão de Projetos da UEFA – Universidade Estadual do Ceará.
De acordo com ele, agora é certo que não haverá como dar o famoso ‘jeitinho brasileiro’. Ou os projetos ficam prontos ou não. A Copa do Mundo do Brasil já está mais cara do que as duas Copas do Mundo anteriores somadas – Alemanha e África do Sul. E nunca um país teve tanto tempo para realizar o evento (sete anos) e atrasou tanto.
“Temos um problema crítico, tanto em relação a custos, quanto a prazos, e o resultado é que, basicamente, o que teremos concluído para a Copa do Mundo são os estádios e algumas obras de infraestrutura, incluindo as temporárias, que ficarão em uso somente durante o evento. Foi falta de gestão de projetos das mais básicas”, comenta.
É fundamental que nós tenhamos iniciativa nas organizações para a melhor condução dos projetos. É uma questão de sobrevivência e desenvolvimento econômico
Germano cita como uma das causas dos problemas ocorridos os erros de estimativa. “Os custos iniciais estimados no Maracanã eram de R$ 600 milhões e, hoje, já ultrapassam R$ 1 milhão e meio. Outra falha foi na concepção dos projetos. Pensava-se em fazer de uma forma o que, na prática, não funcionou. Faltou integração entre todas as partes envolvidas no projeto – esferas dos governos municipal, estadual e federal -, para procedimentos determinados pelos projetos, como desapropriação, liberação de recursos, infraestrutura que passa por órgãos de energia, saneamento, água e liberação ambiental”, diz.
Como resultado do erro de estimativas, grande parte do trabalho foi ficando para o final. “É a famosa síndrome do estudante que deixa tudo para a última hora. Durante muito tempo o governo demorou a agir, entendendo que ainda haveria tempo”, afirma o diretor
E acrescenta: “Quando observamos os projetos prometidos em 2007, na época em que o governo concorreu como país-sede para a Copa do Mundo de 2014, e o que foi entregue até agora, parece que na época as pessoas não sabiam o que diziam e estavam em um mundo de ‘faz de conta’”.
Temos um problema crítico, tanto em relação a custos, quanto a prazos, e o resultado é que, basicamente, o que teremos concluído para a Copa do Mundo são os estádios e algumas obras de infraestrutura, incluindo as temporárias, que ficarão em uso somente durante o evento. Foi falta de gestão de projetos das mais básicas
Segundo o professor, existe uma tendência no Brasil de que quando há um atraso, parte-se para as contratações, licitações e aquisições tendo somente como referência o projeto básico. O que é um erro. “Imaginam que estão ganhando tempo quando, na verdade, estão perdendo, porque uma contratação em cima de um projeto básico, com certeza, levará a mudanças significativas durante a execução. Quando os custos de mudança são maiores, então atrasos e aditivos são inevitáveis”, explica.
Germano acredita que ainda é possível tomar algumas iniciativas para concluir um número maior de obras até junho próximo. O primeiro passo é entender a situação atual de cada cidade-sede e traçar um planejamento de acordo com a prioridade e capacidade de execução.
“É preciso saber estabelecer prioridades. Criar uma sistemática de controle ainda mais extensiva, de monitoramento adequado para que desvios de prazos e de pontos intermediários durante a execução possam rapidamente ser corrigidos, antes que se tornem problemas maiores. Uma vez estabelecidas essas prioridades, algumas obras, que terão que ser entregues para o evento invariavelmente, passarão por aumento de custos, porque haverá mais trabalho em menos tempo, o que requer mais mão de obra e horas extras, entre outros agravantes”, destaca.
Em Fortaleza, exemplifica o diretor, havia um projeto para ampliação do aeroporto, que não será cumprido a tempo. “É um dos mais atrasados do país. A alternativa será a construção de um terminal provisório durante a realização do evento. É o máximo que se conseguirá fazer em relação à parte aeroportuária da cidade”, lamenta.
E completa: “De forma geral, o Brasil não está bem quando o assunto é gerenciamento de projetos, principalmente quando envolve a gestão pública. Outros países não tiveram tanta dificuldade em fazer um evento desse porte. Mas na iniciativa privada o cenário também não é muito diferente. A maioria das empresas tem problemas em seus projetos”.
É preciso saber estabelecer prioridades. Criar uma sistemática de controle ainda mais extensiva, de monitoramento adequado para que desvios de prazos e de pontos intermediários durante a execução possam rapidamente ser corrigidos, antes que se tornem problemas maiores. Uma vez estabelecidas essas prioridades, algumas obras, que terão que ser entregues para o evento invariavelmente, passarão por aumento de custos, porque haverá mais trabalho em menos tempo, o que requer mais mão de obra e horas extras, entre outros agravantes
De acordo com estudo anual feito pelo Project Management Institute (PMI) com cerca de mil empresas brasileiras, a situação do gerenciamento de projetos no Brasil ainda tem muito a evoluir. Os dados apontam que cerca de 25% das organizações costumam ter problemas de prazos nos projetos e 71% delas relatam que têm problemas de custos.
“Outro dado interessante mostra que 14% das companhias pesquisadas possuem problemas de prazos em todos os projetos e 40% na maioria das vezes. Já em relação a custos, 8% delas têm problemas sempre e 39% na maioria das vezes. E 24% das organizações registram um desvio médio de orçamento maior que 10%”, relata o professor.
Ele alerta que os atrasos nos projetos para a Copa do Mundo no Brasil que estão em evidência no momento, estão presentes também em qualquer segmento das empresas brasileiras. “É fundamental que nós tenhamos iniciativa nas organizações para a melhor condução dos projetos. É uma questão de sobrevivência e desenvolvimento econômico”, ressalta.
Segundo Germano, muitos dos gestores atuais não entendem que existe um trabalho relacionado à condução dos projetos que pode ser mais estruturado, baseado em boas práticas internacionais e que existe uma metodologia recomendada que aumenta a qualidade dos empreendimentos.
“Os gestores deveriam buscar a aplicação desses métodos na direção de seus projetos. Assim como existe uma organização que quer vender melhor e, para isso, trabalha a administração do seu departamento comercial criando técnicas para gestão de vendas e acompanhamento de resultados, se a empresa tem projetos, deve buscar a melhor administração deles. Isso não ocorre de forma natural”.
“É preciso buscar uma abordagem de trabalho mais adequada. Para isso, existe um novo conjunto de conhecimentos que pode ser aplicado a projetos e que deve ser apropriado pelos gestores. Não se pode mais trabalhar como antigamente. Hoje, os ambientes são muitos mais complexos, sujeitos a mudanças e é preciso fazer muito mais com muito menos”, conclui.
Redação AECweb / Construmarket
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Cassio Germano – É diretor da Portfolio Gestão e Capacitação, certificado Project Management Professional (PMP) pelo Project Management Institute e doutorando em Administração de Empresas. Um dos pioneiros na pesquisa, ensino e prática do gerenciamento de projetos no Ceará, foi Presidente do Project Management Institute – Seção Ceará (PMI-CE) de 2006 a 2009. Professor e consultor internacional na área de gestão de projetos, programas e portfólios.
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